Aplicação da Súmula 308 do STJ aos imóveis sujeitos a alienação fiduciária
Alteração do entendimento do Superior Tribunal de Justiça.
Rafael Lapa
5/10/2025


A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu recentemente que a Súmula 308 da Corte não pode ser aplicada, nem por analogia, aos contratos de alienação fiduciária de imóveis. A decisão reforça a distinção jurídica entre a hipoteca tradicional, à qual a súmula se refere, e a alienação fiduciária, instrumento hoje amplamente utilizado no financiamento imobiliário.
O caso analisado
O processo envolveu uma construtora que, em busca de crédito, alienou fiduciariamente um apartamento e uma vaga de garagem a uma administradora de consórcios. Anos depois, mesmo sem ser mais proprietária dos bens — cuja titularidade estava consolidada em nome da credora fiduciária —, a construtora comprometeu-se a vendê-los a terceiros, que acabaram ajuizando ação para reverter a consolidação da propriedade.
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) deu razão aos compradores e aplicou por analogia a Súmula 308 do STJ, desconstituindo a consolidação da propriedade fiduciária. A administradora de consórcios recorreu ao STJ.
Entendendo a Súmula 308
A Súmula 308 do STJ estabelece que:
"É inválida a cláusula contratual que estabelece a responsabilidade do promitente comprador pelo pagamento do prêmio de seguro habitacional junto ao Sistema Financeiro da Habitação (SFH), em caso de morte ou invalidez permanente."
Embora inicialmente tenha relação com cláusulas abusivas no âmbito do SFH, a súmula passou a ser interpretada, em muitos julgados, como forma de proteger terceiros adquirentes de imóveis financiados com garantia hipotecária, especialmente no contexto da crise da Encol, nos anos 1990.
A decisão da Quarta Turma
O ministro Antonio Carlos Ferreira, relator do recurso, rejeitou a aplicação da Súmula 308 por analogia à alienação fiduciária. Para ele, essa forma de garantia possui natureza jurídica distinta da hipoteca, o que impede a extensão do entendimento sumular. Ele afirmou:
"O devedor fiduciante, ao contrário do devedor hipotecário, não é o proprietário do bem. Assim, ao negociar o imóvel garantido fiduciariamente, está alienando um bem que não lhe pertence."
A decisão destaca que a venda a non domino — aquela feita por quem não é o proprietário — não produz efeitos perante o titular do direito real, ainda que o comprador tenha agido de boa-fé. Portanto, a promessa de venda firmada pelo devedor fiduciante só tem eficácia entre as partes contratantes, não afetando o direito do credor fiduciário.
Segurança jurídica e impacto no crédito
O relator também alertou que permitir a aplicação da Súmula 308 nesses casos poderia gerar insegurança jurídica e aumentar o risco para os credores, com consequente elevação do custo do crédito imobiliário. Segundo ele:
"É essencial garantir segurança jurídica nos contratos de alienação fiduciária, não apenas para proteger o credor, mas também para assegurar a oferta de crédito acessível ao consumidor."
Conclusão
A decisão do STJ é um marco importante na diferenciação entre garantias fiduciárias e hipotecárias e consolida um entendimento que fortalece a segurança das operações financeiras no mercado imobiliário. Compradores, investidores e incorporadoras devem estar atentos à titularidade real dos bens negociados, especialmente nos casos envolvendo alienação fiduciária.
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